Saturday 2 January 2021

Quo Vadis Covid-19 ?

Onde se revela um efeito secundário das vacinas 

Cuidado com as vacinas. França, 1800, Autor desconhecido.
Caricatura a propósito da epidemia da varíola.


Quo Vadis Covid-19? Ora então, ela há-de desaparecer depois de ter oferecido à humanidade uma bela oportunidade para se redimir, reflectir e, sobretudo, ler romances e poesia... Falhou! Haja esperança... As vacinas vão tentar completar o trabalho!
    É a propósito delas que te falo hoje. Não te posso revelar a fonte, é confidencial, mas fiquei a par de certos efeitos secundários das vacinas que a maior parte dos humanos espera. Estou perfeitamente ciente que uma outra (e considerável) parte rejeita-as por causa dos efeitos secundários prováveis, possíveis e imaginários como os chips implantados no sangue, produzidos e financiados por uma vasta rede de cabalas satânicas: organização mundial dos pedófilos, estado profundo, tecnologia 5g, empresa Dominion, socialistas, comunistas radicais, Soros, Hillary, Gates, Hanks e outros da mesma cepa. Alegações que têm sido inteligentemente (e cientificamente) demonstradas pelos seguidores daquele loiro esquisito (o americano, esqueci-me do nome...) que perdeu as eleições graças às supracitadas (e tenebrosas) instituições. 
    Apercebem-se, no entanto, luzes cintilando na escuridão como a que nos chega da mais poderosa nação da América do Sul que se encontra, felizmente (e finalmente), em boas mãos. O iluminado que a dirige, moreno tropical, ex-militar destemido, refinado e brilhante (esqueci-me do nome, é aquele que fala de hemorróidas durante as reuniões ministeriais) já declarou publicamente que se vai opor à nova e esquerdista administração do tio Sam. Utilizando pólvora se necessário for! Com o desassombro descomplexado que o caracteriza, o Einstein tropical em questão previne que, ao sermos vacinados, corremos o risco de, e cito: «[...] virar um chimpanzé, [...] um jacaré, [...] super-homem [...] nascer barba em alguma mulher [...]» Conhecendo o elevado QI do animal político em questão (e de seus seguidores e eleitores), não é advertência a menosprezar.
    Ora, meu kamba, é aqui que me sinto embatucado porque, segundo minhas fontes confidenciais, há um efeito secundário não desvendado. E embatucado porquê, perguntar-te-ás. É que nenhum repórter por ele se interessou, nenhum eleito nem partido político, nenhuma direcção da saúde pública, governo ou instituição cultural. Não garanto que a vacina russa ou chinesa produza o mesmo efeito, os poderosos à cabeça dessas potências nem sequer vieram a público entregar o ombro imperial à frágil seringa. Preferem imunizar-se contra a influência dos demónios ocidentais e suas democracias ruins e corruptas. 
    Estamos, portanto, perante quatro produtos investidos da bíblica missão de salvar a humanidade. Dois deles (Pfizer e Moderna) posicionaram-se no stock market, permitindo-te embolsar kumbu se fores pessoa de investimentos. Os demais, todavia, foram segregados por muitas das nossas democracias, cuja liberdade não chega ao ponto de no-los deixar escolher. Quanto aos temidos efeitos secundários, há nuance: entre nós homens verifica-se uma preferência pela Moderna, convencidos que uma empresa que criou o Viagra maquinou efeitos secundários capazes de animar o quotidiano maçudo do confinamento. 
    Voltemos ao cerne deste artigo, a tal grande revelação. Preparem-se, aí vai: As duas vacinas criadas no mundo ocidental estimularão o interesse por géneros literários maltratados pelos leitores deste mundo, o romance e a poesia! Contra os quais tanta gente parece estar vacinada.
    Estou consciente que muitos dos frequentadores de redes sociais ficaram desiludidos com esta declaração, eles esperavam um furo jornalístico, uma espécie de anúncio espectacular, uma bomba mediática como fazem os seres de luz investidos da augusta missão antivacina. Mas não... Desculpa-me este anticlímax, o desencanto que provavelmente sentes, meu kamba, afinal até tens razão: quem é que se interessa por romances e poesia? Só os velhos como eu, habituados a ler inutilidades como Os Maias, Capitães da Areia, Memorial do Convento, Os irmãos Karamazof, Madame Bovary, O Velho e o Mar, O Retrato de Dorian Gray, Dom Quixote, Cem Anos de Solidão, As Flores do Mal, Livro de Sóror Saudade, etc, etc, etc. 
Compreendo mesmo a cólera de alguns leitores, porque a pergunta é pertinente e urgente: Quem diabos teve essa maldita ideia de estimular o interesse por romances e poesia através das vacinas? Sobretudo quando é sabido que uma fatia importante dos escritores de sucesso foi amamentada pelo seio esquerdista da mãe literatura. Senão vejamos, o mundo editorial, sempre aberto a um livro a sangrar com vivências horríveis em prisões, descrevendo torturas ignóbeis e execuções pela calada da noite, não te abre o postigo quando lhes bates à porta com um romance ou, pior, recolha poética nas mãos. 
    Olha-me eu para aqui com lamúrias e até tive sorte, sou um mal-agradecido: não é que um editor extravagante (maluco?) se encheu de coragem e lançou uma produção saída da minha pobre imaginação para o lago pouco profundo dos leitores de romances? Foi há dois anos, num lançamento com muitos amigos, muita compra e alguns repórteres... E depois? Depois, a quase totalidade dos livros ficou languidamente pousada nas prateleiras das livrarias. 
    Sejamos, porém, modestos e digamos que este romance não terá merecido a atenção da crítica nem do grande público por ser provavelmente fraquinho apesar do seu volume. E os outros autores? Os milhares que são quotidianamente preteridos em favor das obras dos conspiracionistas e cavadores de escandaleiras? É claro que podes arcar tu próprio com as despesas de produção da tua obra, contudo, e mesmo não sendo profeta ou astrólogo, não lhe entrevejo um brilhante futuro se for romance ou poesia. A menos que possuas um nome que seja uma chancela que se vende por si próprio. Por isso o lobby ao qual pertenço conseguiu esta aparente vitória: convencer os fabricantes de vacinas a criarem um efeito secundário pró romance e poesia. 
Quo vadis Covid-19? Não sei, mas tenho o sentimento que não há-de calcorrear as linhas estreitas (às vezes profundas) do romance. Olha meu kamba, dado que o meu moto é «O fracasso só acontece com a renúncia», vou colocar os meus romances em dieta, emagrecê-los até os reduzir ao tamanho de um ecrã de telemóvel. Faz o mesmo com a tua poesia.

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© Carlos Taveira

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Assim Escrevia Bento Kissama, Romance, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 296p, ISBN: 9789897024764 

São Paulo, Prisão de Luanda, Memórias, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 176p, ISBN 9789897024511 

Texto Editores, Lisboa, Portugal, Lisboa, 2006, 319p, ISBN : 9789724731452

La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2014, 560p, ISBN 978-2-89699-392-5.

De la racine des orages, Poésie, Français.
Les Éditions L'Interligne, 2014, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

Mots et marées tome 2, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2015, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

A Feather for Pumpkin, Fiction, English
Create Space, 2016, 186p,  ISBN-10: 1519662505, ISBN-13: 978-1519662507

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Wednesday 22 April 2020

O Segundo Fôlego

O barco, os remos e esta longa regata 
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Fonte: pngitem.com

Foi-me ensinado pelo Antunes, nosso treinador de remo. Ele dizia: quando pensas que já deste tudo, há um segundo fôlego que se instala. Quem praticou esse maravilhoso desporto sabe que, a um dado momento da competição, pensamos que somos incapazes de chegar ao fim. Mas conseguimos. Tive o discutível privilégio de viver alguns anos duros em confinamento (político). Quando saí, encontrei-o e ele perguntou-me: achas que o remo te serviu para aguentares a barra? E eu: lembrava-me sempre do segundo fôlego. Acho que lhe surpreendi uma lágrima no canto do olho.

Ele dizia: quebramos mas não vergamos. O remo, para esse homem, era missão, ele nunca quis ganhar um chavo como treinador. Ele dizia: mais de 6 meses de treino para uma prova de minutos, é assim a vida. Não sei se este «é assim a vida» vem dele ou é imaginação minha, arrisco contudo a imprecisão porque ela, a vida, é assim, posso afirmá-lo hoje do alto dos meus 66 anos. E tal como na vida, às vezes perdíamos, às vezes ganhávamos, mas nunca parávamos de remar.

Ele tinha pouco mais de 50 anos quando o conheci (eu tinha 13). Chamávamos-lhe Velho Antunes. Com ele aprendi que o racismo era coisa ilógica, que podíamos resolver assuntos votando, que as mulheres podem fazer tanto como os homens e que seria bom aprendermos outras línguas para sabermos que o mundo era muito mais vasto e aberto do que aquele que aprendíamos nas escolas. E ele lia revistas e escutava emissoras em francês e em inglês. Para escapar ao confinamento do «orgulhosamente sós».

Ele dizia: para criar endurance hoje vão lutar, não vale murros nem pontapés, nem meter os dedos nos olhos, nem apertar os tomates. Peneirávamos um quadrado de areia e lutávamos corpo a corpo. Quando chegávamos ao fim (fez isso a primeira vez, depois aprendemos) ele disse: agora vão nadar para refrescar (era a estação das chuvas). E quando mergulhámos foram os gritos por causa da água salgada nos corpos arranhados pela areia, não sei se já passaste por isso... Desatámos a nadar e o sprint só parou nas ilhas de areia frente ao barracão dos barcos. Ele ria: é para criar endurance.

Ensinou-nos a remar a dois, a quatro ou sozinhos. Com remos parelhos ou com um só. Com timoneiro ou sem ele. Quem praticou esse nobre desporto que é o remo sabe que a equipa navega perfeitamente sincronizada, que há um objectivo a atingir. Que é como um confinamento numa embarcação pouco mais larga que a largura das nossas nádegas... Bom... Não sei que envergadura têm as tuas hoje, mas naquela altura éramos jovens escorreitos, cabiam todas lá. E remávamos em companhia de outros, a dois, a quatro ou sozinhos. Dirigidos ou sem timoneiro. O cavalão mais resistente sentado à voga para nos obrigar a segui-lo até deitarmos os bofes pela boca.

Lembro-me de uma gripe malandra que assolou aquelas terras. Dava muita febre, atacava pulmões e ficávamos acamados. Popularmente conhecida como Laurinda. Apanhei-a. Fui para a cama com ela. Atirou-me abaixo mas assim que recuperei voltei ao remo. Ainda não estava em plena forma quando fomos para o campeonato provincial («Preparar para largar... Senhores... Estão prontos? Larga!») Quando a prova chegou àquele momento em que pensei que não era capaz de chegar ao fim, ouvi a voz do Velho Antunes vinda da margem da baía. Ele gritava: Taveiraaaaaa... O segundo fôlego. 

E ele veio... E ganhámos!


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© Carlos Taveira

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La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
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Wednesday 8 April 2020

Libertando quarentenas pascoais cá por dentro

Encalhados na Páscoa ou navegando neste mar?
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Do site (com a devida vénia): FEE Foundation for Economic Education
  
   Prisão de Páscoa não é, digo-te...
   
   Sou muito inculto, já o sabes, e ingénuo também, reconheço-o, mas nisto de cadeias até nem sou totalmente ignorante. Eu e muitos outros que por força das circunstâncias travaram conhecimento com uma quarentena sem vírus. Nas cadeias há, grosso modo, dois tipos de especialistas: os que estão lá dentro e não podem sair e os que estão lá fora para não deixarem sair quem foi confinado. Detido. Preso. Encarcerado. Cativo. Enclausurado. Cangado.

   Sobretudo quando o isolamento se passa em países de pensamento único e a prisão (também) serve para encerrar quem não se comporta como a ideologia no poder quer, exige e impõe. E quando se pertence a esta categoria de encalhado não se pode andar por aí a vadiar Internet fora. Ai! Isso não. Nem sequer ouvir rádio, nem telefonar aos amigos ou planificar sessões de WhatsApp com filhos e netos. Ou teletrabalho. Ou fazer amor à companheira... ou companheiro é conforme (se viveres com ele ou com ela). Nem receber e oferecer ovos de Páscoa...

   Os esbirros dos caudilhos que aferrolham com estrondo  trancas de ferro de portas de aço não o fazem para salvar contaminados. É que eles temem a infecção das ideias dissidentes. É para se salvarem a eles próprios e aos da sua laia. Não é para te salvar a vida, repito. Ai! Isso não. Afianço-te. Às vezes até é para que te aconteça o oposto.

   Por isso não digas que te sentes como numa cadeia porque não estás numa delas, juro-te. Olha... Podes cozinhar coisas boas e ir às compras. Podes comprar chocolates de Páscoa em forma de ovos. É-te permitido chocalhar o gelo de um copo de uísque e abrir um tinto velho. Como ninguém te requisitou a biblioteca à procura de livros malditos, é-te permitido escolher uma obra e lê-la. Podes encher a banheira e mergulhar num banho de imersão com uma cerveja IPA na mão e na outra os quadradinhos da Balada do Mar Salgado, de Hugo Pratt, navegando aventuras em companhia de Corto Maltese e do vicioso Rasputine. Podes sentar-te num aparelho e remar para fazer exercício enquanto deslizas sobre uma baía imaginária...

   E o mais importante de tudo. Podes abrir as portas... Por dentro!

   Porque o preso não possui chaves nem Páscoa. Por definição uma cadeia é um lugar onde as celas só possuem uma porta com uma fechadura que fica do lado de fora. E esse é o aspecto essencial que distingue a casa onde vives da prisão onde outros, neste momento, estão detidos, presos, encarcerados, cativos, enclausurados, cangados...

   Ilustrando com exemplos que vivi de perto? Primeiro caso: alguns presos tentaram fugir de uma dessas masmorras de caudilho e foram capturados. Segundo caso: ontem, na minha cidade, a polícia encontrou num parque cidadãos que, devido à quarentena, não tinham o direito de ali estar. Desenlace: Os primeiros apanharam, e digo-o em português vigoroso, uma carga de porrada à coronhada e paulada que lhes ficou na memória (e nos ossos); Os segundos foram educadamente enviados para casa com uma multa de oitocentos e tal dólares no bolso.

Não, não digas que estás na prisão... Nem que seja por respeito àqueles que, em países onde a epidemia é feita de intolerância e repressão, foram detidos... presos... encarcerados... cativos... enclausurados... cangados... 

Maltratados!

Pensa neles porque estás livre... Faz teletrabalho. Mergulha num banho, lê, abre o rádio, ouve os teus álbuns preferidos, vai às compras (respeitando os critérios de protecção), apanha sol, degusta um copo de uísque velho com gelo, prepara um arroz de mariscos... Ri-te com amigos, filhos e netos pelo WhatsApp... Toca piano ou órgão se o sabes fazer... Fotografa a primavera... Cria uma rotina, é importante...

Prisão é outra coisa... Garanto-te!



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© Carlos Taveira

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Assim Escrevia Bento Kissama, Romance, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 296p, ISBN: 9789897024764 

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Texto Editores, Lisboa, Portugal, Lisboa, 2006, 319p, ISBN : 9789724731452

La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
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De la racine des orages, Poésie, Français.
Les Éditions L'Interligne, 2014, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

Mots et marées tome 2, Roman, Français
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Monday 24 February 2020

Eu Eutanásia sou

Mata-se a dor dormindo ou paleando-a acordados?
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Tenho lido muito comentário sobre o que em Portugal se chama eutanásia e em francês canadiano, com pudor, Aide Médicale à Mourir (AMM). Já agora vai mais uma expressão francesa a propósito: Déjà vu. Porque é esta a impressão que me fica quando leio artigos na imprensa escrita, falada, televisiva e comentários nas redes sociais em proveniência do outro lado do Atlântico. Comparando os ecos de um debate que neste Canadá se esgotou há anos aos que se esgrimem na actual Lusitânia, verifica-se que são do mesmo teor e sabor, acompanhados por semelhante cortejo de indignações, pavores, estremecimentos humanistas e previsões trágicas. Vai daí, como se faz nos países democráticos, os governos levaram o assunto à praça pública, escutaram, leram, consultaram, analisaram... E deixaram o assunto entre as mãos dos eleitos que, depois dos habituais espectáculos partidários, reconheceram em maioria que a vida, do ponto de vista da laicidade, é pertença de quem a possui. Nesta via, e ignorando crenças religiosas, sensibilidades culturais, éticas pessoais e posições partidárias, o Canadá escreveu leis, traçou linhas vermelhas e criou condições que até Abril do ano passado tinham ajudado 6749 cidadãos a morrer. Aqueles que por considerações pessoais decidiram enveredar pelo caminho mais longo e sofredor foram ajudados com paliativos, ninguém os empurrou para atalhos. 

     No fundo é simples: empatia por uns, respeito pelos outros, simpatia por todos. Explicado por extenso: não escolhi vir ao mundo e ajudaram-me, ajudem-me por favor a sair dele se eu optar por essa via.

     Como nunca sofri a ponto de atentar contra a minha vida nem, pior, contra a de um ente querido que sobrevive dormindo drogado e urrando acordado, fui ler o que Ángel Hernández, um espanhol que matou a esposa, Maria Carrasco, tinha a dizer sobre o assunto. Pois o homem, mesmo se destroçado, diz que não se arrepende, fê-lo a pedido da própria Maria cuja esclerose múltipla não a deixava falar, comer, ficar de pé ou escrever, para lá de a martirizar com graves problemas de audição e visão. E como o Ángel não era assassino, imagino que ao matar a companheira morreu algo dentro dele. Outrossim, gravou o acto para sensibilizar quem nunca foi torturado, dado que no mui católico reino de Espanha encurtar o sofrimento é pecado e é proibido. Maria Carrasco tinha 61 anos.

     Fui igualmente questionar o senhor Google sobre o caso Marieke Vervoort vencedora de várias medalhas de ouro nos paraolímpicos. Eis o que ele me disse. Que a atleta sofrera de tetraplegia progressiva, doença que a condenaria a uma morte certa e atroz se Marieke não a tivesse recusado. Vivendo num país onde a morte assistida está em vigor desde 2002, esta verdadeira heroína nacional, depois de assinar a papelada, aproveitou a sua notoriedade para explicar às outras nações que a ausência da morte assistida é, para quem sofre, intolerável: «Penso que haverá menos suicídios quando todos os países legalizarem a eutanásia.» E abandonou o estádio como sempre o fez, com dignidade e muita coragem. Marieke Vervoort tinha 40 anos.

     O debate português esgotou-se como o canadiano, os políticos discutiram, decidiram, escreveram textos que seguem os caminhos prescritos, esperemos que não venha milagre inesperado que o impeça de virar lei. Portugal entrará assim no clube restrito dos países que permitem a morte assistida, são seis actualmente. 

     Independentemente desta, há na Lusitânia uma outra discussão que persiste, furiosamente, com insultos, injúrias, ameaças, ódios e rilhar de dentes, é o omnipresente racismo que conhece verdadeiras erupções pontuais onde os adjectivos corrosivos se inflamam como obuses incendiários. Aqui não se fala da legalidade do racismo, coisa caduca e criminosa professada por seres obsoletos e delinquentes: ao contrário da eutanásia, a torpe ideologia é proscrita pela constituição na mesma linha em que o fascismo é banido. Trata-se aqui de uma altercação sem diálogo onde ninguém se diz racista e muitos o são, alguns conscientemente e os outros sem disso se aperceberem. Não lhe vejo o fim, acudam-me, no meu modesto entender nem é debate é cacofonia. Ademais, tenho visto tanto especialista de redes sociais lançar teorias às cacetadas que me sinto como aquele bom samaritano que vai separar dois contendores e apanha nas ventas de ambos. Enquanto a zoada zoa, as vítimas do vírus do racismo agem como alguns pacientes sofrendo de doenças terminais, calam-se e não exteriorizam publicamente a dor que os mina por dentro. E quando o calvário do oprimido é insuportável e os gritos impossíveis de conter, são lapidados por gente armada de pedregulhos de píxel, mesmo por alguns que acreditam estarem imunes ao vírus, sem tomarem consciência das suas mutações.

     Com tanto especialista a pronunciar-se com autoridade, escrever, ler e comentar sobre o assunto, vem-me a impressão que, de tanto ser usada, esta palavra racismo perde a cor. Deslavando-se, sim, mas sem perder a essência, há ódios que se acalentam com muita ternura e estimação, mesmo quando provocam sofrimentos para os quais, ao contrário dos outros, não existem paliativos nem soluções humanamente químicas.

     E como os preconceitos espreitam por todos os poros das nossas sociedades, espero que nunca racializem a eutanásia visto que é impossível eutanasiar o racismo.


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Assim Escrevia Bento Kissama, Romance, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 296p, ISBN: 9789897024764 

São Paulo, Prisão de Luanda, Memórias, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 176p, ISBN 9789897024511 

Texto Editores, Lisboa, Portugal, Lisboa, 2006, 319p, ISBN : 9789724731452

La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2014, 560p, ISBN 978-2-89699-392-5.

De la racine des orages, Poésie, Français.
Les Éditions L'Interligne, 2014, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

Mots et marées tome 2, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2015, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

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Saturday 16 November 2019

À loira de vermelho que me roubou um livro

Ou como fui alvo de um raro privilégio
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É, nem tudo está perdido, ainda há quem roube livros. Aconteceu-me na cidade de Quebeque, capital da província do mesmo nome, lá onde o Canadá começou. A sociedade de genealogia da província convidara-me para falar sobre Pedro da Silva dit le Portugais, bravo lisboeta que ali se radicou por volta de 1673 e por lá se casou com a jovem Jeanne Greslon dite Jolicoeur, espigada canadiana de Château Richer com quem teve 14 ou 15 filhos. Atenção, não te inches de orgulhoso patriotismo com a performance do compatriota lusitano, aquilo era comum na época, mesmo franceses e ingleses eram capazes de tal façanha. Pedro foi o primeiro mensageiro do rei (Luís XIV) do Canadá na Nova França e transportador geral de mercadorias que distribuiu, tal como o correio, entre Montreal e Quebeque sob o ataque dos insectos vorazes no Verão e dos frios assassinos do Inverno. Tudo isto arriscando a vida numa guerra entre ingleses e franceses com índios nos dois lados. E aquela prole fez do lisboeta o antepassado da numerosa família canadiana Dassylva que muito o venera ao ponto de um deles (antes da Internet) se ter deslocado a Lisboa para verificar se ainda havia por lá quem se chamasse Silva.

Como vês, entusiasmo-me quando dele falo, imagina numa conferência com slides, micro, grande sala, assistentes e tudo. E como tinha escrito (e publicado) um livro sobre o personagem, havia-os à venda. Depois da conferência e sessão de autógrafos, encontrava-me em amena cavaqueira com alguns dos assistentes quando a irmã da minha companheira me perguntou se aquela senhora com muito bom aspecto, loira de casaco vermelho, viera à assinatura dado que à caixa não. Lembrava-me muito bem dela. A qualquer conferencista masculino heterossexual não passaria despercebida a senhora loira com (muito) bom aspecto, atentíssima à conferência. Pois estava tão interessada no nosso Pedro que decidiu levá-lo sem pagar. O furto foi confirmado quando, feitas as contas, se verificou a falta de um exemplar. Quem me acompanhava não ficou contente: «Nem numa conferência, vejam lá», indignava-se uma; «Até livros roubam», juntou a segunda; «É preciso ter lata», finalizava a terceira.

E eu? Pois admira-te... Eu exultei!

Não vi neste sublime gesto de roubar literatura um acto condenável. Seria quiçá pessoa vivendo momentos de stress financeiro e que, obrigada a escolher entre o alimento do espírito e o do corpo, decidiu satisfazer com dignidade os dois, não pagando o primeiro. Decisão judiciosa: é seguramente mais fácil sair de uma sociedade de genealogia sem pagar um livro que de um restaurante sem pagar a conta. Foi também uma première para mim. Antes daquela noite nunca fora roubado. Nem uma televisão na casa de Angola, nem um carro no aeroporto de Montreal, nem sequer uma nota de vinte nos eléctricos 12, 15 e 28 em Lisboa, a abarrotar de carteiristas nacionais e estrangeiros. 

Livros, então, nunca correram riscos. Já os deixara em evidência em carros com a porta aberta... Encontrei-os lá! Já me esquecera de obras literárias sobre mesas de café e os empregados guardaram-nas! Já lera policiais caros em locais cheios de bandidos e nunca mos furtaram. Nunca fui roubado, é verdade, mas já fiz mão baixa de algo que não me pertencia.  Guarda isto para ti, não quero dar maus exemplos aos meus netos. Eu conto. Foi na sala de espera de um consultório médico que os meus olhos caíram sobre uma revista de História, abandonada, coitadinha, a um canto da estante. O coração encheu-se-me de ternura e compaixão pela revistinha e perguntei-me qual seria o fim de criatura tão sábia, provavelmente despedaçada, rasgada impiedosamente, folhas amachucadas para limpar os vidros da Primavera. Revoltado contra tamanha crueldade, tomei a decisão de lhe poupar a triste sina. Como quem não quer a coisa dobrei a revista, instalei-la no bolso interior do casaco e abandonei a sala de espera assobiando com naturalidade. Ninguém se deu conta. E como a aventura se passou antes da massificação dos telemóveis, os demais pacientes liam revistas de moda. Revistinha é bem tratada e vive dias felizes na companhia das manas revistas e manos livros, legalmente comprados e adoptados. E a tal ponto não faço diferença entre eles que já me esqueci quem foi a roubada e quem foram os adquiridos. Eis porque tenho a certeza que o exemplar do Pedro da Silva conhece a mesma sorte e vive feliz ao lado dos congéneres numa bela estante indisciplinada e que de lá só sai para alimentar o espírito de quem ainda é assaltado por esse tipo de fome. 

Desconheço quase tudo a propósito da dita senhora que me subtraiu, com tanta graça, o livro que escrevi há muitos anos. Era loira, bem penteada, cuidava do seu aspecto, tinha casaco vermelho e sentou-se diante de mim para ouvir falar de Pedro da Silva dit le Portugais. E ficou-me o sentimento que o primeiro mensageiro da Nova França teria estoirado de orgulho se soubesse que fora raptado por uma bela senhora de Quebeque, cidade que muito amou e onde se reproduziu galhardamente.

A conferência tendo sido proferida em francês, haverá poucas probabilidades para que a senhora loira do casaco vermelho venha a ler este artigo. Todavia, no caso improvável de ser lusófona e estas linhas lhe caírem sob os olhos claros, saiba que o seu gesto enaltece a literatura e não hesite em trazer-me o produto do seu latrocínio, concedendo-me o privilégio de o dedicar: «À senhora loira de casaco vermelho que, na mui nobre e antiga cidade do Quebeque, correndo risco de ser acusada de ladroagem, se apoderou desta obra, esperando que a qualidade da mesma esteja à altura das suas expectativas. E não hesite em apoderar-se de outro dos meus livros se a necessidade apertar e a oportunidade se lhe apresentar: ser roubado por uma amante da literatura é raro privilégio».



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© Carlos Taveira

LIVROS ASSINADOS PELO AUTOR DO BLOGUE
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Assim Escrevia Bento Kissama, Romance, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 296p, ISBN: 9789897024764 

São Paulo, Prisão de Luanda, Memórias, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 176p, ISBN 9789897024511 

Texto Editores, Lisboa, Portugal, Lisboa, 2006, 319p, ISBN : 9789724731452

La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2014, 560p, ISBN 978-2-89699-392-5.

De la racine des orages, Poésie, Français.
Les Éditions L'Interligne, 2014, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

Mots et marées tome 2, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2015, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

A Feather for Pumpkin, Fiction, English
Create Space, 2016, 186p,  ISBN-10: 1519662505, ISBN-13: 978-1519662507

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Saturday 21 September 2019

Meio Cheio... Meio Vazio...

Diálogos sobre a realidade dos enchimentos
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Conheces pessoas optimistas que dizem que o mundo vai melhor? Ou as outras, que afirmam o contrário como o meu amigo Rebenta Balões? É um tipo roído por sentimentos ácidos em relação ao mundo hodierno, suas governanças e desgovernações. Passou por um festival de análises e a saúde estava mais ou menos. O colesterol mantinha-se elevado, é claro, mas baixara uns pontos. O que lhe deu pretextos para uma almoçarada que nem te conto. Sou o primeiro a falar:

- Para ti, este copo está meio cheio ou meio vazio?
- Estou farto dessa porra de pergunta de psicólogo de meia-tigela.
- Por outras palavras: és optimista ou pessimista?
- Cagando! Nem um nem outro. Realista... Estás a par do conceito?
- Que importa? Algumas pessoas vêem o futuro com esperança... Outros é o contrário.
- Não sou do género binário. 
- Tu é... Talvez!
- Sou pelo cálculo de probabilidades.
- E que mal tem perguntar se o copo está meio cheio ou meio vazio?
- Porque não sei a quantidade de líquido que está lá dentro, carago. Qual é o tamanho do copo? Um copinho meio cheio ou meio vazio de um decilitro tem menos vinho para distribuir que um copo do tamanho de uma jarra de dez litros a um terço da sua capacidade.
- Mas essa jarra... Quando está a meio como é que a vês? Meia cheia ou meia vazia?
- Meia, simplesmente. A metade! Com cinco ou dez litrinhos é a medida que conta... Já agora diz-me lá Herr Freud : qual é a diferença entre litrinho e litrão?
- Bom... Quando vou ao médico digo-lhe que bebo um litrinho por semana.
- Sentes-te menos culpado, né? A medida exacta de litrinho ou litrão é um litro, ou dez decilitros...Meio cheio ou meio vazio... Mas sempre podes rezar.
- Rezar! A que propósito?
- Quando vires o copo meio vazio roga a Deus para que ele te ajude a vê-lo meio cheio.
- Que comparação!
- Sentes-te menos pobre e não reivindicas aumento de salário. De repente viras meio rico em vez de meio pobre.
- Já cá faltavam os teus esquerdismos.
- Esquerdista, eu? Para tua informação sou como o Mobuto Sesse Seko... Lembras-te do ditador africano? Aquele que morreu bilionário...
- Sou suficientemente velho para me recordar dele. Presidente do Zaire.
- Do Congo, é assim que se deve dizer hoje.  
- Que vem o Mobutu aqui fazer?
- É que ele dizia: nem à esquerda, nem à direita, nem mesmo ao centro!
- Ah! Ah! Ah!
- Tinha razão. Hoje, isso de esquerda ou direita não conta. É para cima ou para baixo: Winner ou loser!
- Conta sim... Tu és evidentemente de esquerda. Toda a gente o diz...
- Olha se fosses mandar essa gente aaa... Lamber sabão? Quando digo que o Bolsonaro é uma avantesma sou de esquerda ou de direita?
- De esquerda, olha lá a pergunta... E então se te puseres a defender os índios... Esquerdopata incurável!
- Realista, é o que sou! Analiso a quantidade de adjectivos pútridos que lhe saem da boca versus os sãos... E a imagem é clara.
- Não gostas dele porque o homem disse que no Brasil não se mataram suficientes esquerdistas como tu.
- Até me fazes mijar de rir. Se tivesse coragem para isso, aquela abentesma fazia uma razia da extrema-esquerda até à direita inteligente, passando por centro, centro-esquerda, ecologistas, sociais-democratas, feministas, gays e lésbicas e mais não digo. Tudo o que lhe fica à esquerda é esquerdista. Até os índios kayapós da amazónia são comunistas.
- Estás a ver? Quando falas do homem vês-lhe o copo meio cheio de veneno.
- Meio cheio? Aquilo é jarras a transbordar de peçonha extraída das cepas da burrice.
- Iiiih! Vê lá se as tuas cepas de ódio ainda destilam venenos semelhantes e te matam.
- Eu destilo contravenenos! Antídotos! Vacinas! Anticorpos...
- OK... Acalma-te, olha a tensão. Falemos de outro com mais coragem e poder: Trump.
- Queres que eu tenha um AVC ou quê?
- Bolsonaro... Trump... Foram eleitos... E tu és um grande defensor da democracia.
- Sempre disse que para a democracia funcionar razoavelmente são necessários eleitores razoavelmente educados.
- Conheço muita gente educada que votou no Bolsonaro.
- Hã?
- Sim... Pessoal com estudos, que escreve coisas giras no Facebook. Falam de concórdia, paz e amor. Pais e mães de família. Até lá colocam fotos de crianças giríssimas... 
- Mas ouve lá... Estás a provocar-me ou quê? O Hitler foi eleito por montes de pessoas como essas.
- O Salazar...
- O Salazar eleito? Porra! És mais burro do que eu pensava... Se fosses brasileiro votavas no absconso.
- Quando me interrompeste, eu ia dizer que até há gente boa que gosta do Salazar.
- Porra! Até há gente boa que gosta de comida escocesa...
- Isso são os escoceses.
- Mau exemplo, é verdade. A comida é duvidosa mas olha, nunca elegeram ditadores. Se calhar é o uísque que os faz ver claro.
- Por falar em uísque... Vai mais um?
- Mas sem esse gelo que pões no teu... Estragas tudo. Arre! É bom demais...
- É... Quantos entalámos?
- Sei lá... Deixa ver... Ora bolas... A garrafa está meio vazia!

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© Carlos Taveira

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Assim Escrevia Bento Kissama, Romance, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 296p, ISBN: 9789897024764 

São Paulo, Prisão de Luanda, Memórias, Português, Guerra e Paz, Editores, Lisboa, Portugal, 2019, 176p, ISBN 9789897024511 

Texto Editores, Lisboa, Portugal, Lisboa, 2006, 319p, ISBN : 9789724731452

La traversée des mondes, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, Ottawa, 2011, 576p, ISBN 978-2-89699-392-5

Mots et marées, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2014, 560p, ISBN 978-2-89699-392-5.

De la racine des orages, Poésie, Français.
Les Éditions L'Interligne, 2014, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

Mots et marées tome 2, Roman, Français
Les Éditions L'Interligne, 2015, 186p, ISBN 978-2-89699-404-5

A Feather for Pumpkin, Fiction, English
Create Space, 2016, 186p,  ISBN-10: 1519662505, ISBN-13: 978-1519662507

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